Ser
Real quer Dizer não Estar Dentro de Mim
Seja
o que for que esteja no centro do Mundo,
Deu-me
o mundo exterior por exemplo de Realidade,
E
quando digo "isto é real", mesmo de um sentimento,
Vejo-o
sem querer em um espaço qualquer exterior,
Vejo-o
com uma visão qualquer fora e alheio a mim.
Ser
real quer dizer não estar dentro de mim.
Da
minha pessoa de dentro não tenho noção de realidade.
Sei
que o mundo existe, mas não sei se existo.
Estou
mais certo da existência da minha casa branca
Do
que da existência interior do dono da casa branca.
Creio
mais no meu corpo do que na minha alma,
Porque
o meu corpo apresenta-se no meio da realidade.
Podendo
ser visto por outros,
Podendo
tocar em outros,
Podendo
sentar-se e estar de pé,
Mas
a minha alma só pode ser definida por termos de fora.
Existe
para mim — nos momentos em que julgo que efetivamente
existe —
Por
um empréstimo da realidade exterior do Mundo
Se
a alma é mais real
Que
o mundo exterior como tu, filósofos, dizes,
Para
que é que o mundo exterior me foi dado como tipo da realidade"
Se
é mais certo eu sentir
Do
que existir a cousa que sinto —
Para
que sinto
E
para que surge essa cousa independentemente de mim
Sem
precisar de mim para existir,
E
eu sempre ligado a mim-próprio, sempre pessoal e intransmissível?
Para
que me movo com os outros
Em
um mundo em que nos entendemos e onde coincidimos
Se
por acaso esse mundo é o erro e eu é que estou certo?
Se
o Mundo é um erro, é um erro de toda a gente.
E
cada um de nós é o erro de cada um de nós apenas.
Cousa
por cousa, o Mundo é mais certo.
Mas
por que me interrogo, senão porque estou doente?
Nos
dias certos; nos dias exteriores da minha vida,
Nos
meus dias de perfeita lucidez natural,
Sinto
sem sentir que sinto,
Vejo
sem saber que vejo,
E
nunca o Universo é tão real como então,
Nunca
o Universo está (não é perto ou longe de mim.
Mas)
tão sublimemente não-meu.
Quando
digo "é evidente", quero acaso dizer "só eu é que o vejo"?
Quando
digo "é verdade", quero acaso dizer "é minha opinião"?
Quando
digo "ali está", quero acaso dizer "não está ali"?
E
se isto é assim na vida, por que será diferente na filosofia?
Vivemos
antes de filosofar, existimos antes de o sabermos,
E
o primeiro fato merece ao menos a precedência e o culto.
Sim,
antes de sermos interior somos exterior.
Por
isso somos exterior essencialmente.
Dizes,
filósofo doente, filósofo enfim, que isto é materialismo.
Mas
isto como pode ser materialismo, se materialismo é uma filosofia,
Se
uma filosofia seria, pelo menos sendo minha, uma filosofia minha,
E
isto nem sequer é meu, nem sequer sou eu?
Alberto
Caeiro, in "Poemas Inconjuntos"
Olá Denise!
ResponderExcluirAh, que texto maravilho deste belíssimo poeta. Sou suspeito para falar de seu criador, pois Fernando Pessoa é minha inspiração. Mais Caeiro tinha sua alma própria. Uma estrela em personalidade e essência, vivendo dentro de um outro poeta.
Uma belíssima postagem esta tua. Adorei tudo. o texto, as imagens, a composição em si!
Abraços meus,
e bom fim de semana!
Canata
Adorei o seu post. O texto é maravilhoso, argumento perfeito para quem quer discordar da dita realidade, e da definição mundana da mesma. Muito obrigada por esse post inspirador, parabéns!
ResponderExcluirBeijos.
Tenha um ótimo domingo para você $:
ResponderExcluirBeijos :*